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Local que abrigou seita no Chile vai virar memorial – 19/07/2025 – Sylvia Colombo

A imagem mostra uma exposição em um museu, com uma cama hospitalar antiga coberta por colchas listradas. Ao fundo, há uma parede repleta de quadros com fotografias de pessoas, possivelmente funcionários ou pacientes, e um grande painel informativo com dados e imagens relacionadas à história do hospital. À direita, uma manequim vestido com um uniforme de enfermeira, incluindo um avental e um chapéu.

Em 1961, uma figura sinistra desembarcou em Santiago. Seu nome era Paul Schäfer, um ex-oficial nazista que partira da Alemanha. Depois da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), ele trabalhou numa instituição que atendia crianças carentes. Logo, porém, passou a ser perseguido por crimes de guerra e acusações de abusos a menores que estavam sob sua guarda.

Schäfer decidiu fugir para o Chile acompanhado de um grupo de religiosos que ele havia conquistado com a habilidade de quem se transformaria em um carismático pregador.

O que ocorreu depois foi de arrepiar. Schäfer conquistou corações e mentes de alemães e descendentes que viviam no Chile. Com eles, instalou-se na chamada Colonia Dignidad, a 350 km da capital, numa inóspita região do interior da comuna de Parral.

A Colonia Dignidad passou a ser uma seita com suas próprias regras —e elas eram terríveis. Os colonos eram submetidos, todos os dias, a um esquema de trabalho forçado por, no mínimo, 16 horas.

Homens e mulheres dormiam em galpões separados, e os filhos não sabiam quem eram seus pais. Poucas crianças de fora entraram na colônia. Às vezes, os líderes adotavam meninos e meninas locais sob o pretexto de que lhes dariam comida e saúde.

Todo tipo de intimidade era proibido: não havia a possibilidade de encontro com amigos, muito menos de namoro. Após a longa jornada de trabalho, ouvia-se a pregação de Schäfer antes do jantar e, depois, todos eram obrigados a ir para a cama.

A colônia era protegida por arames eletrificados. Com a fuga de alguns membros ao longo do tempo, a verdade foi vindo à tona: vítimas contaram em tribunais alemães que ali se praticavam a escravidão, o abuso de menores por parte de Schäfer, além de experimentos médicos e genéticos.

Como se não bastasse, durante a ditadura militar chilena (1973-1990), o local abrigou também prisioneiros políticos e serviu como centro clandestino de torturas —38 ossadas surgiram no começo das investigações. Também foi usado para armazenar armas.

Após a redemocratização do Chile, Schäfer entrou na mira não apenas da Justiça do país, mas também da alemã. Ele, então, refugiou-se na Argentina, mas foi preso e condenado em 2005, apenas cinco anos antes de sua morte.

Muitos governos chilenos da era pós-ditadura não souberam bem o que fazer com esse legado. Até hoje, por exemplo, o local é habitado por ex-colonos que não tinham para onde ir e fundaram ali a Villa Baviera, um hotel e restaurante com direito a tours sinistros pelos túneis clandestinos, incluindo o que ligava o quarto de Schäfer ao dormitório infantil.

Na semana passada, o presidente Gabriel Boric resolveu colocar um ponto final na história. A colônia será transformada em um centro de memória. A maioria dos ex-colonos hoje vive na Alemanha ou em outros locais do Chile. Também recentemente, o governo alemão decidiu reparar financeiramente as vítimas e familiares. Afinal, autoridades do país conheciam a procedência de Schäfer e permitiram que ele saísse do território.

É difícil que esse dinheiro baste para reparar o ocorrido. Conversar com um ex-colono, mesmo já adulto, como já me aconteceu, é como estar diante de uma criança inocente, analfabeta, sem recursos sociais para voltar ao mundo. Além do já proposto por Boric, valeria a pena criar também um centro de reabilitação para que eles possam voltar a viver em sociedade.



Fonte ==> Folha SP

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