O tarifaço de Donald Trump contra o Brasil entra em vigor na próxima quarta-feira (6) em meio a forte alta nos investimentos de empresas brasileiras nos Estados Unidos. O estoque desse tipo de operação alcançou US$ 22,1 bilhões no fim de 2024, crescimento de 52,3% em relação a dez anos atrás, segundo levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Apenas nos últimos cinco anos, mais de US$ 3,3 bilhões foram anunciados para novas operações, consolidando os EUA como principal destino de investimentos greenfield (projetos de de implantação de produtiva do zero) do Brasil no exterior.
Pelo menos três empresas podem ampliar investimentos nos Estados Unidos nos próximos anos para mitigar os efeitos das tarifas de 50%:
- a Suzano estuda construir uma fábrica de celulose de fibra longa para embalagens de papel;
- a Embraer pode investir além dos US$ 500 milhões já previstos para cinco anos, a depender de vendas do cargueiro militar KC-390 Millenium àquele país; e
- a Taurus, maior fabricante brasileira de armas, considera transferir toda a produção do Rio Grande do Sul para os Estados Unidos.
A expansão do capital brasileiro nos EUA
Desde 2013 foram 142 projetos de investimento implementados, segundo a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil) e a Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham). Cerca de três mil empresas brasileiras mantêm investimentos diversos na maior economia mundial, refletindo forte integração econômica entre os dois países.
“O setor produtivo brasileiro vê na integração com os Estados Unidos muito mais que comércio: vê parceria. O avanço dos investimentos de ambos os lados, ao longo dos anos, reforça o caráter complementar e os benefícios mútuos dessa relação”, destaca Ricardo Alban, presidente da CNI.
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A presença brasileira alcança pelo menos 23 dos 50 estados americanos. A Flórida lidera com 12 unidades produtivas, seguida por Geórgia (7), Michigan (6), Minnesota (6), Missouri (6), Nova York (6), Tennessee (5) e Texas (5). Miami, na Flórida, destaca-se como centro de operações devido ao acesso facilitado à América Latina.
Gigantes como JBS, Embraer e WEG impulsionam os números
Grandes empresas têm anunciado investimentos significativos. A Embraer, terceira maior fabricante de aviões de passageiros, ampliará sua fábrica na Flórida aplicando US$ 99,2 milhões. A empresa também prevê a implantação de um centro de manutenção no Texas, projeto que demanda aporte de US$ 70 milhões e gerará 250 empregos diretos.
A JBS lidera os anúncios de investimentos dos últimos cinco anos, com US$ 607 milhões. Para 2025, pretende expandir sua operação no Texas e inaugurar um centro de distribuição no Colorado, investimento combinado de US$ 200 milhões. Anteriormente, havia anunciado a construção de nova planta em Iowa, com potencial para gerar 500 empregos.
A Sustainea, joint-venture entre Braskem e a japonesa Sojitz, investirá US$ 400 milhões até 2028 na construção de uma fábrica em Indiana. A planta produzirá componentes químicos usados em produtos do dia a dia, como recipientes para alimentos e calçados. A iniciativa conta com parceria da Universidade de Purdue e da Primient, uma empresa local que fornecerá componentes químicos à base de milho.
Muitas dessas iniciativas integram o programa SelectUSA, do governo americano, que visa atrair investimento direto. São 65 projetos registrados que superam US$ 1 bilhão em investimentos e têm potencial para gerar mais de 2,5 mil empregos diretos.
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Empresas brasileiras fortalecem sua presença no mercado americano através de fusões e aquisições estratégicas. A catarinense WEG adquiriu os ativos da Heresite Protective Coatings, fabricante de revestimentos anticorrosão, por US$ 9,5 milhões neste ano, e comprou as operações globais de motores e geradores da Regal Rexnord por US$ 400 milhões em 2023.
Em 2023, a Suzano adquiriu duas fábricas da Pactiv Evergreen, produtora de embalagens para alimentos e bebidas, por US$ 110 milhões. A Tcloud, controlada pela Telefônica Brasil, comprou a IPNET e IPNET USA, empresas especializadas em soluções digitais e parceiras da Google, por US$ 42,2 milhões.
Ameaça protecionista: tarifa de 50% coloca oportunidades em risco
Apesar do otimismo, uma nuvem de incerteza paira sobre esses investimentos. Há temores de que, diante do tarifaço de Trump, a economia americana perca fôlego, com menor crescimento e maior inflação.
Entenda o tarifaço de Trump sobre produtos brasileiros
A taxação sobre o Brasil no atual mandato de Trump começou em fevereiro, com o restabelecimento de sobretaxas sobre importações de aço (25%) e alumínio (elevada de 10% para 25%), aplicadas a todos os países, inclusive o Brasil, que antes gozava de isenção. O Brasil é o principal fornecedor dos EUA de produtos semiacabados, lingotes e outras formas primárias de ferro ou aço.
Em abril, o republicano detalhou seu plano de reciprocidade nas tarifas (“Fair and Reciprocal Plan on Trade“), no qual o Brasil ficou no grupo menos tarifado, com alíquotas de 10%.
Na última quarta-feira, porém, o presidente norte-americano assinou decreto que elevou de 10% para 50% a tarifa sobre a importação de boa parte dos produtos brasileiros. Trata-se da maior taxação vigente no momento.
A ordem executiva de Trump que instituiu o tarifaço tem uma lista de exceções com quase 700 produtos. Ainda essim, estima-se que de 55% a 60% das exportações do Brasil aos EUA foram atingidas pela nova alíquota.
O impacto na economia brasileira dependerá de eventual retaliação. Estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) aponta que, no curto prazo, podem ser perdidos 110 mil postos de trabalho, especialmente na agropecuária e no comércio, além de R$ 19,2 bilhões no PIB. Com retaliações profundas de ambos os lados, a CNI calcula que podem ser fechados 5 milhões de empregos em até 10 anos e custar 6% do PIB.
Dez maiores investimentos de empresas brasileiras anunciados nos EUA (2020-24), segundo a CNI
- JBS: US$ 607 milhões
- Serena Energia: US$ 420 milhões
- CSN: US$ 350 milhões
- Bauducco Foods: US$ 200 milhões
- Embraer: US$ 192 milhões
- Tramontina: US$ 120 milhões
- Cross Comerce Store: US$ 120 milhões
- Beontag (Grupo CCRR): US$ 119 milhões
- Marfrig: US$ 100 milhões
- Petropar: US$ 100 milhões
Fonte ==> UOL