Dos vários supostos xingamentos que recebi nos comentários por cometer essa coluna, o único que achei comentável foi a acusação, ofensa ou constatação entediada de eu ser um “isentão“.
Não que me importe a opinião de quem não importa, mas acho semi divertida e quase interessante a convicção alheia (seja de onde venham, convicções são sempre parecidas) de que se você não escolher o “lado certo”, estará 100% errado e jamais será perdoado por isso.
Sei que não adianta explicar para quem prefere ser surdo, ou mostrar para quem escolheu não ver, mas acredite (ou não, tanto faz) que a suposta “isenção” não é, necessariamente, ausência de posicionamento.
Ser (ou estar) “isento” pode também representar uma equidistância, um afastamento higiênico suficiente para desprezar, com muito vigor, ambos os “oponentes”. Ou, simplesmente, não querer optar entre as constantes vilanias e tosquices retrógradas, que os líderes máximos das duas frações possuem e perpetram em abundância.
Não é falta de coragem para escolher. É falta de estômago para aturar.
Vendo de longe, que é onde prefiro estar, os dois times, tirando as cores das camisetas, são mais parecidos que diferentes.
Claro que aqueles que, além de dar seus votos aos seus ídolos políticos, também são devotos destes, jamais vão reconhecer as similaridades. Afinal, militante acha feio o que não é espelho.
Para isso servimos nós, os “isentões”: demonstrar que a incapacidade de escolher talvez seja por falta de ferramentas ou tecnologias que permitam distinguir, minimamente, por exemplo, qual é a diferença entre quem acredita que a Terra é plana, ou quem é convicto que gênero não tem nada a ver com biologia? Quem é mais negacionista e anticiência?
Ou entre a turma que acha que vacinas matam e os que têm certeza que as piadas é que são fatais?
O que é mais bizarro, extravagante ou ridículo: o deslumbramento cafona de uma primeira-dama ou arrebatamento doidão da outra?
Quem assusta, enche mais o saco ou reivindica e consome mais verbas públicas: os que usam a religião como ideologia, ou aqueles que fazem da ideologia, religião?
O que soa mais esquisito: gays com Bolsonaro ou “for Palestine“?
Só para confundir ainda mais, os dois lados também odeiam a Globo e amam o Putin. Ou seja, a dificuldade para diferenciar aumenta a facilidade para não embarcar.
Agora, só para esclarecer, comento esse tipo de comentário, não para contrariar um dos meus principais mandamentos: “não darás palanque para manés”, mas porque isso não é uma resposta, é uma despedida.
Foram 32 semanas, 8 meses e também foi um prazer encontrar a grande maioria de vocês. Vou me dedicar a novos projetos, talvez a criação do PIB (Partido Isentista Brasileiro), ou começar a luta pela criação do “Dia do Orgulho Isento”.
Pois, ao contrário dessa coluna, a vida continua.
Fonte ==> Folha SP