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Musculoso é o novo magro – 22/07/2025 – Bruno Gualano

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Marco, 18 anos, sempre teve um perfil atlético, mas se achava muito magro. Há cerca de um ano, decidiu adicionar à prática de corrida —paixão da infância— sessões diárias de musculação. Atento às dicas de um influencer-maromba que seguia no Instagram, mudou radicalmente sua alimentação: cortou doces, frituras e alimentos considerados “lixos” e adotou uma dieta quase exclusiva de frango com batata-doce. Pesava tudo o que comia, registrava os macronutrientes em um aplicativo e evitava fazer refeições fora de casa, temendo perder o controle sobre ingredientes e porções.

Aos poucos, a busca por massa muscular deu lugar a uma meta mais específica: a definição corporal e a redução do percentual de gordura. Marco passou a tomar whey protein três vezes ao dia e a comer além da saciedade, convencido de que precisava de mais calorias para “crescer seco”. Abandonou a corrida, pois prejudicava o ganho de músculos. Iniciou-se no crossfit. Incentivado pelos novos parceiros de treino, fez um ciclo de anabolizantes, “apenas para acelerar o processo”.

A rotina de treinos e dieta começou a se sobrepor aos estudos e à vida social. Levava marmitas para a faculdade e até para festas, justificando que não podia sair do plano. Declinava convites para viajar, pois perderia os treinos. Embora muitos o vissem como um rapaz atraente e musculoso, ele acreditava nunca estar suficientemente grande ou definido. Obsessivo ao falar de comida e músculos, era tido pelos amigos como altamente disciplinado e comprometido com o autocuidado.

Foi durante um check-up que os sinais de alerta surgiram: frequência cardíaca muito baixa, queda de pressão ao se levantar, anemia, níveis baixos de testosterona. Em seguida, vieram à tona as crises de ansiedade e depressão. Fora encaminhado ao psiquiatra. Apesar de não temer ganhar peso —desde que fosse “músculo puro”—, Marco apresentava distorção da imagem corporal, supervalorização do físico e comportamento alimentar rígido e restritivo. Como seu quadro não se encaixava completamente nos critérios clássicos da anorexia, bulimia ou compulsão, recebeu o diagnóstico de “outro transtorno alimentar especificado“. Mas qual seria ele?

Marco sofre de transtorno alimentar orientado à muscularidade, caracterizado por uma preocupação obsessiva de não ser musculoso o suficiente. Isso o leva a práticas extremas, como contagem compulsiva de calorias, alimentação forçada mesmo sem fome, consumo excessivo de proteínas, rejeição a alimentos considerados “não funcionais”, ansiedade ao imaginar quebrar a dieta ou faltar aos treinos, e uso frequente de suplementos e esteroides anabolizantes.

Esse transtorno afeta cerca de 22% dos homens e 5% das mulheres jovens nos EUA. Não há dados de sua prevalência no Brasil, mas um estudo apontou que, entre praticantes de crossfit de ambos os sexos, a busca por muscularidade foi um fator de risco importante para sintomas de transtornos alimentares.

O transtorno alimentar orientado à muscularidade traz riscos à saúde física e mental, exigindo hospitalização em casos graves. Ainda assim é frequentemente subdiagnosticado, porque seus sinais patológicos são confundidos com virtudes contemporâneas —autocontrole, disciplina e resiliência.

A pressão pelo corpo ideal desempenha um papel decisivo no desenvolvimento desse transtorno, ao internalizar padrões estéticos inalcançáveis, que geram uma insatisfação corporal irremediável. Assim como o fictício Marco, muita gente é seduzida pelo canto da sereia fitness, que promete saúde e bem-estar. Em vez disso, encontra transtornos mentais e comportamentais.



Fonte ==> Folha SP

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