A ferrovia transoceânica que promete conectar os litorais do Brasil, no Oceano Atlântico, e do Peru, no Pacífico, ganhou um aceno positivo da China, uma das principais interessadas no empreendimento que pode custar até US$ 100 bilhões — cerca de R$ 550 bilhões na cotação atual.
A partir de agora, a Infra S.A., empresa pública ligada ao Ministério dos Transportes, vai trabalhar com o Instituto de Planejamento e Pesquisa Econômica da China State Railway Group para o desenvolvimento de estudos de viabilidade da ferrovia. Não foi divulgado quando o material ficará pronto.
O acordo firmado na segunda-feira (7) é resultado da visita ao Brasil de uma delegação chinesa em abril e da missão oficial brasileira ao país asiático, com a presença dos ministros da Casa Civil, Rui Costa, e do Planejamento, Simone Tebet. Na ocasião, a ministra reconheceu que a construção da ferrovia só é possível com participação da China.
“Precisamos de capital estrangeiro e, atualmente, quem possui os recursos necessários é a China, tanto no setor privado quanto no público”, disse Tebet. O memorando de entendimento não deverá se aprofundar nos traçados e nas obras em si, mas em um modelo de viabilidade para futuros investimentos e concessões na Bolsa de Valores de São Paulo (B3).
A expectativa do governo brasileiro é de que a parte mais significativa da estrutura sob trilhos, que compreende os eixos da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) e da Ferrovia de Integração Centro-Oeste (Fico), seja leiloada no primeiro semestre de 2026. No papel, elas conectam Ilhéus (BA) e Lucas do Rio Verde (MT).
No Brasil, são mais de 4 mil quilômetros de trilhos entre Ilhéus e a fronteira com o Peru, pelo Acre. Disso tudo, apenas 15% está pronto, sendo que o trecho final, depois de Lucas de Rio Verde até Cruzeiro do Sul (AC), ainda não tem um projeto pronto e representa cerca de 35% do total do empreendimento em solo brasileiro, como apresentado abaixo:
- Fiol 1: Ilhéus (BA) a Caetité (BA): 537 km (já construída)
- Fiol 2: Caetité (BA) a Barreiras (BA): 485 km (em construção)
- Fiol 3: Barreiras (BA) a Mara Rosa (GO): 838 km (em projeto)
- Fico 1: Mara Rosa (GO) a Água Boa (MT): 383 km (em construção)
- Fico 2: Água Boa (MT) a Lucas do Rio Verde (MT): 505 km (em projeto)
- Lucas do Rio Verde (MT) a Cruzeiro do Sul (AC), chegando na fronteira com o Peru em Boqueirão da Esperança (AC), passando antes por Vilhena (RO), Porto Velho (RO) e Rio Branco (AC): 1.416 km (em projeto)
O governo do Peru não tem um projeto para a parte que lhe cabe na ferrovia, que terá de atravessar a Cordilheira dos Andes para chegar ao porto de Chancay, a 80 quilômetros da capital Lima.
O porto, construído pelos chineses, custou US$ 1,3 bilhão e é operado pela estatal chinesa China Cosco Shipping Corporation e pela empresa peruana Volcan — na primeira etapa de funcionamento, o porto tem capacidade para movimentar 1 milhão de contêineres e 6 milhões de toneladas de carga solta por ano.
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Brasil “fortalece laços” com a China a partir do acordo de ferrovia transoceânica
O interesse chinês na ferrovia transoceânica não é por acaso. Caso a obra se concretize, o país asiático terá acesso mais rápido e mais barato às commodities brasileiras, como soja e minério de ferro. E, no caminho inverso, os produtos industrializados chineses chegarão com mais rapidez à América do Sul, isso porque não será mais necessário que os navios passem por rotas marítimas tradicionais, incluindo o Canal do Panamá.
A ditadura chinesa trata esse e outros projetos de logísticas como a “Nova Rota da Seda”. Na Ásia, África e Europa, a China também vem investindo em projetos de infraestrutura, especialmente em portos, para facilitar as exportações e reduzir custos no acesso a matérias-primas fundamentais para a economia do país.
Na assinatura do acordo com o Brasil, o representante chinês, diretor-geral da China State Railway Group, Wang Jie, disse que a parceria é “fruto da sabedoria e confiança mútua” e que vai “contribuir no dinamismo e desenvolvimento dos transportes em nossos países”. Por sua vez, o secretário nacional de Transporte Ferroviário, Leonardo Ribeiro, comemorou o que ele considera “o primeiro passo de uma jornada técnica, institucional e diplomática” que vai “fortalecer os laços entre nações que compartilham uma visão de longo prazo”.
O governo brasileiro vem tratando a ferrovia transoceânica como um ativo estratégico para a logística nacional e não quer perder a oportunidade de contar com os chineses. Por isso, vem correndo contra o tempo para ter algo concreto antes das eleições de 2026, que podem mudar os rumos das relações Brasil-China, hoje bastante alinhadas em uma agenda de cooperação entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ditador chinês Xi Jinping.
“É por isso que estamos trazendo os melhores do campo ferroviário para nos dar subsídios”, afirmou Ribeiro, acrescentando que instituições dos dois países trabalharão em conjunto para que os estudos da ferrovia “se concluam e tragam bons resultados”.
Fonte ==> UOL