Além do tarifaço para o Brasil, na última semana, os Estados Unidos anunciaram a abertura de uma investigação comercial para apurar supostas práticas desleais do governo brasileiro que afetam a economia americana, incluindo o Pix, sistema de pagamento nacional popular entre brasileiros.
Não é a primeira vez, porém, que o presidente americano, Donald Trump, usa essa tática para justificar tarifas e outras sanções contra os países. Recentemente, um sistema de pagamento da Indonésia, que funciona de forma semelhante ao Pix, também foi apontado como uma ameaça a empresas americanas que atuam no setor de pagamentos, como Visa e Mastercard.
O Escritório de Representação Comercial dos EUA (USTR) publicou um relatório em maio com uma revisão do que considera “injusto” nas relações comerciais mantidas com uma série de países, incluindo a Indonésia. Uma das críticas feitas mencionou o Código de Resposta Rápida Padrão Indonésio (Quick Response Code Indonesian Standard, em inglês), mais conhecido pela sigla QRIS, um sistema de pagamento digital lançado em 2019, um ano antes do Pix.
O governo dos EUA argumentou que o instrumento passou a “preocupar” empresas americanas por ser apontado como uma barreira comercial a Washington, declaração que sustentou o plano de Trump de impor uma tarifa de 32% sobre produtos da Indonésia que entram nos Estados Unidos, em 2 de abril, no chamado “Dia da Libertação”. Nesta semana, os dois países chegaram a um acordo para baixar essa tarifa para 19%.
O QRIS e o Pix têm a mesma finalidade: eles sincronizam os pagamentos eletrônicos, por meio de carteiras digitais ou serviços bancários disponíveis no celular, em um único sistema padrão nacional. A partir disso, basta escanear um código QR e o pagamento leva apenas alguns segundos para ser concluído, facilitando as transações e tornando-as mais ágeis.
Segundo dados oficiais, somente no ano passado mais de 30 milhões de pequenas empresas e comerciantes em toda a Indonésia realizaram transações via QRIS.
Perceptivas para o Pix: como posição dos EUA pode afetar o sistema de pagamento QRIS
Antes de serem lançados no mercado, sistemas de pagamentos passam por uma rigorosa avaliação internacional. O QRIS precisou alinhar-se a padrões globais, os mesmos adotados pela Europay, Mastercard e Visa, as três gigantes do ramo.
Segundo um artigo publicado no The Conversation, as empresas americanas também são membros da Associação de Sistemas de Pagamento da Indonésia e tiveram conhecimento da elaboração do QRIS, acompanhando o governo e o banco central, apesar de o relatório do governo americano dizer que elas não estiveram a par do desenvolvimento do sistema.
Esse rótulo de “barreira comercial” usado pelos americanos pode gerar impactos direitos para a economia do país asiático. A análise do The Conversation cita, por exemplo, a capacidade dessa investigação dos EUA, que ainda não teve uma conclusão divulgada, obstruir parcerias da Indonésia com outros países.
A expansão do QRIS para transações comerciais com outras nações pode não evoluir devido a essa medida. Alguns países, como Cingapura, Malásia e Tailândia já permitem o uso do QRIS em seus sistemas nacionais de pagamento.
Em maio, o Banco da Indonésia também anunciou que o sistema de pagamento passaria a funcionar no Japão e na China a partir de agosto. Índia e Coreia do Sul também estão no caminho para implementar o QRIS.
Negociação com os EUA
Contudo, a posição oficial do governo Trump agora pode mudar totalmente a rota desses acordos, visto que alguns desses países não querem criar atritos com os Estados Unidos e buscam evitar tarifas mais altas.
Outro efeito que essa investigação pode ter para a Indonésia é que pode dificultar a expansão de pequenas empresas indonésias para mercados internacionais, uma das prioridades que levaram ao desenvolvimento do serviço – para agilizar o processo de transação, incluindo transações transfronteiriças com compradores estrangeiros.
Na quarta-feira (16), o presidente da Indonésia, Prabowo Subianto, confirmou que fechou um acordo com seu homólogo americano, Donald Trump, para reduzir as tarifas sobre o país de 32% para 19%, e disse que seguirá “negociando”.
“Falei com o presidente Trump e, depois de duras negociações, finalmente chegamos a um acordo. Em outras palavras, nós entendemos os interesses deles e eles os nossos, e concordamos que as tarifas serão reduzidas de 32% para 19%”, disse Prabowo à imprensa. Não foi divulgado, no entanto, se o QRIS fez parte da negociação.
Trump foi quem anunciou o acordo horas antes por meio da rede social Truth Social. O americano disse que o pacto “abre a totalidade do mercado da Indonésia para os EUA” e que as exportações americanas para o país asiático “estarão livres de barreiras tarifárias e não tarifárias”.
Ainda não se sabe o que irá acontecer com o caso do Brasil, que já enfrenta uma ameaça de tarifa de 50% sobre importações. A semelhança com o caso da Indonésia mostra que o país teria mais a ganhar sentando-se à mesa de negociação com Trump.
Leia a íntegra do relatório dos Estados Unidos sobre práticas de uma série de países consideradas injustas por Washington aqui.
Fonte ==> UOL