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Plano de decreto do MEC para EAD causa reações negativas no setor privado; entenda por que

Governo deveria ter publicado regra em dezembro, mas texto permanece oculto; MEC diz que fez consultas públicas e principais pontos foram apresentados ao setor

BRASÍLIA – O plano do decreto do governo federal para regulamentar a educação a distância no País tem sido alvo de reações negativas entre membros do setor privado de ensino superior, responsável por 95,9% das matrículas na modalidade.

Segundo o Estadão apurou, parte do setor se sente alijado da formulação das normas e às escuras. Uma petição contra a proposta de regras – que reúne nomes do mercado e especialistas – tem circulado desde a semana passada e já reúne cerca de 8 mil assinaturas. A Associação Brasileira de Educação a Distância também lançou manifesto (leia mais abaixo).

O Ministério da Educação (MEC) não apresentou ao setor a versão final do decreto, cuja publicação era prevista até 31 de dezembro, mas até o momento não veio a público. Há expectativa de divulgação este mês.

Questionado, o MEC afirma que promoveu consulta pública sobre o tema e ouviu especialistas e instituições representativas da área. “Embora o texto final do decreto não seja de conhecimento público, os principais pontos da proposta foram apresentados ao setor da educação superior”, diz a nota do MEC (leia mais abaixo).

Como o Estadão mostrou, o governo pretende criar uma nova modalidade, o ensino semipresencial; além de incluir regras para atividades síncronas (em tempo real) e assíncronas; obrigação de provas presenciais; entre outras.

Especialistas e representantes do mercado concordam que falta melhor regulação no setor, diante da explosão do EAD desde 2018, quando foram flexibilizadas as regras para criar graduações desse tipo. Também são frequentes críticas de falta de qualidade em parte das graduações, como naquelas de formação de professores.

Mas, com o modelo sinalizado pelo MEC, o setor privado tem reforçado o discurso de que as medidas em curso vão dificultar o acesso da população mais pobre ao ensino superior. Conforme o Estadão, esse é um dos pontos que trava a divulgação o decreto, uma vez que o governo avalia possíveis impactos da medida e a melhor forma de comunicá-la.

Com o atraso no decreto, o governo prorrogou por mais um mês a proibição de abertura de novos cursos EAD no País, o que também motivou críticas do setor.

Abaixo-assinado reúne nomes de peso

A petição organizada na semana passada para questionar o decreto do MEC já reúne cerca de 8 mil assinaturas. O grupo encaminhou ofício ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pedindo que não assine o decreto e o coloque em discussão, entre outros pontos.

Na lista de signatários, há nomes de peso do setor, com o empresário Janguiê Diniz, do grupo SER Educacional, que está entre os maiores do País na área. Procurada pelo reportagem para comentar o abaixo-assinado, a assessoria de Diniz não se manifestou.

O texto da petição diz que o MEC vem escalando desde 2023 uma “campanha sistemática contra a EAD”. O documento afirma que o MEC realizou consultas públicas “protocolares” para elaborar o decreto e restringiu o texto a um núcleo sem conhecimento e experiência na educação a distância moderna.

A petição critica ainda pontos antecipados pelo MEC ao Conselho Consultivo para o Aperfeiçoamento dos Processos de Regulação e Supervisão da Educação Superior (CC-Pares), revelados pelo Estadão, e diz que medidas ameaçam 5 milhões de alunos.

“Os alinhamentos antecipados pelo MEC sobre o Decreto colocam o País na contramão das tendências internacionais de cobertura, alcance, tecnologia e qualidade na EAD”, diz o texto, que pede que o governo reveja a proposta.

Criador da petição, o professor João Vianney, ex-coordenador do Laboratório de Ensino a Distância da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e sócio da consultoria Hoper, afirma que a proposta do MEC quebra os quatro pilares responsáveis pela expansão da EAD: capilaridade, flexibilidade, amplo catálogo (variadas opções de cursos), e preço popular.

Um dos pontos mais criticados pelo setor é a exigência de um número limite de estudantes para as atividades síncronas. Antes de finalizar o texto, o MEC divulgou que haveria um teto de 50 estudantes por turma durante as atividades ao vivo.

“Isso extrapola os custos da operação sem agregar vantagem didático-pedagógica. As mensalidades vão saltar de 25% a 45%, a depender do atual modelo de operação. E, para a população mais pobre, o valor da mensalidade é muito sensível”, afirma Vianney.

Pesquisador em Educação e doutor em Economia pela Universidade Vanderbilt (EUA), Cláudio de Moura Castro é um dos signatários da petição. Castro – que já presidiu a Capes, órgão de avaliação da pós-graduação ligado ao MEC – defende que o ministério foque em aprimorar a avaliação de resultados dos cursos a distância em vez de determinar como deve ser o processo pedagógico.

“Vamos supor que Einstein estivesse vivo e dá uma aula no vídeo. Essa aula teria de ser só para 50 pessoas. Quanto é que você ia pagar para o Einstein dar uma aula no vídeo? Quanto esse curso ia custar? Inviabilizaria tudo”, diz Castro. “Se tem resultado, para que o MEC vai dizer quantos alunos tem de ter diante do professor? Que diferença faz?”

Associação critica governo

Já o manifesto da Abed critica as últimas medidas empreendidas pelo governo federal, que, segundo o texto, representam “retrocesso significativo no acesso à educação e na inclusão social.”

O texto menciona, por exemplo, a restrição para que cursos de saúde e licenciatura funcionem neste formato. Recentemente, o ministro da Educação, Camilo Santana, afirmou que o curso de Enfermagem é um dos que não serão autorizados a ter aulas a distância nas novas normas que serão divulgadas.

“Em muitas localidades, postos de saúde, creches e escolas dependem da formação a distância. A restrição desses cursos ameaça um verdadeiro apagão de professores e outros profissionais em setores já fragilizados, afetando não só os estudantes, mas toda a população atendida por esses profissionais”, diz o manifesto da Abed.

Presidente da Associação, João Mattar afirma que embora a Abed tenha participado do CC-Pares, o fato de o MEC não mostrar como ficou a proposta final aprofunda os problemas. “Vimos apenas um PowerPoint com algumas ideias gerais”, afirma.

Ele cita que nos tópicos apresentados pelo MEC um dos pontos de discordância é o aumento da exigência de atividades presenciais para cursos a distância.

“O governo nunca apresentou, por exemplo, estudos para dizer o que vai acontecer com a mensalidade, o que vai acontecer com os professores, o que vai acontecer com os enfermeiros. Tem um movimento bom de revisar os referenciais (da EAD), mas o documento que vai sair parece ter mais problemas do que a gente imaginava”, analisa.

O que diz o governo

Em nota, o MEC afirmou que em 2023 realizou consulta pública sobre o tema, que indicou a necessidade de revisão dos referenciais de qualidade da EAD e a construção de novas regras regulatórias e instrumentos de avaliação.

Segundo a pasta, a partir de 2024, com base nessa premissa, o ministério iniciou o processo de reformulação das normas e incluiu diversos setores:

“O MEC deu início a um trabalho intenso, que envolveu especialistas com larga experiência em EaD e com sólida formação acadêmica, baseada na escuta a representantes de entidades e instituições de educação superior públicas e privadas, que inclui o Conselho Consultivo para o Aperfeiçoamento dos Processos de Regulação e Supervisão da Educação Superior – CC-Pares, além da realização de audiências públicas, e uma série de visitas e reuniões técnicas para conhecer os diversos modelos de oferta da EAD”, acrescenta.

Fonte>Estadão

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